Artigos Filmes

Sci Files: Os 40 Anos de E.T. – O EXTRATERRESTRE


No mesmo ano em que John Carpenter lançou o seu O ENIGMA DE OUTRO MUNDO, e que também contou com outro clássico da ficção científica, BLADE RUNNER – O CAÇADOR DE ANDRÓIDES, de Ridley Scott, Steven Spielberg apresentou ao mundo sua versão mais família e mais próxima do universo infantil de um contato de um humano com um alienígena. Na verdade, Spielberg já havia apresentado uma versão paz e amor dos contatos de E.T.s em seu CONTATOS IMEDIATOS DO TERCEIRO GRAU (1977). É possível dizer que ele nadava na contramão do que era normalmente visto nos filmes sci-fi, principalmente os apresentados na década de 1950, com o medo do comunismo e da ameaça nuclear.

E.T. – O EXTRATERRESTRE (1982), nesse sentido, seria um filme transgressor, e isso se apresenta explícito na cena em que a equipe da NASA invade a casa de Elliott (Henry Thomas) para capturar o pequeno E.T. A cena parece saída de um filme de terror e é construída dentro das convenções desse gênero. Ou seja, mesmo nos Estados Unidos da era Reagan e com a Guerra Fria ainda em pauta, em E.T. o mal não vem do exterior, mas de dentro. E de dentro pode vir também a maldade ou a bondade, mais representada na pureza das crianças. E é nessa pureza que o coração vermelho e brilhante do E.T. bate forte, ao se conectar com Elliott.

Havia visto E.T. há muitos anos (algumas décadas, na verdade) na televisão e não era um dos defensores mais ferrenhos do filme – na verdade, costumava dizer, por puro achismo, que o Spielberg dos anos 1990 era melhor que o da década de 1980. Porém, com o relançamento do filme nos cinemas em versão IMAX para celebrar seus 40 anos, pude perceber o porquê dele ter se tornado uma obra tão querida e um dos títulos mais representativos de seu período – sobre ter a cara dos anos 1980, basta ver o quanto ele se tornou um dos maiores recortes para, por exemplo, uma série como STRANGER THINGS.

Não se trata de uma obra com uma preocupação grande nos diálogos. Há a intenção, inclusive, de torná-los muito simples, muito fáceis, quase que em sintonia com as palavras “E.T.”, “phone” e “home”, aprendidas e repetidas pelo pequeno alien. O que mais importa e o que mais se destaca lindamente é a força das imagens embaladas pela magistral trilha de John Williams, a emoção que elas carregam em sua plasticidade, seja numa cena iconográfica como a do voo da bicicleta, sejam os close-ups emocionados dos personagens nos instantes finais. O trabalho brilhante de montagem, que já se destacava em Spielberg desde pelo menos ENCURRALADO (1971), portanto aqui se perpetua e ganha ares de magia.

E.T. e Elliott (Henry Thomas)

No mais, o longa também conquista pelo humor, pelo encanto do relacionamento que se estabelece entre o pequeno E.T. e as crianças que o conhecem. Cito, por exemplo, a cena da conexão à distância, com o E.T. tomando umas cervejas e assistindo DEPOIS DO VENDAVAL, de John Ford, e o menino Elliot agindo como agiu na escola. Lindo demais. E tenho quase certeza que seria uma cena bem difícil de ser vista no cinema mainstream contemporâneo, já que o menino Elliott se embriaga, ainda que de maneira indireta.

Ver ou rever este clássico em IMAX é uma rara experiência, já que que ele ganha muito mais força na tela grande. Além do mais, Spielberg se arrependeu da besteira que fez no aniversário de 20 anos do filme, quando substituiu as armas por walkie-talkies e fez umas “atualizações” nos efeitos especiais, seguindo o (mau) exemplo do amigo George Lucas. Assim, é possível ver as imperfeições, por assim dizer, dos efeitos visuais, especialmente na última cena das bicicletas voando. E.T. – O EXTRATERRESTRE recebeu os Oscars de som, efeitos sonoros, efeitos visuais e trilha sonora original. Houve indicações para filme e direção também, mas nessas categorias Spielberg demorou para conseguir a validação da academia, só conseguindo o primeiro Oscar em 1993 com A LISTA DE SCHINDLER.

Até hoje, quando se conta a história da Nova Hollywood, culpa-se Spielberg e Lucas por terem quebrado o ritmo mais político e adulto que o cinema norte-americano vinha seguindo antes de TUBARÃO (1975) e STAR WARS (1977), e trazido um tom mais infantil para o cinema mainstream a partir dos anos 1980. Mas acredito que ele apenas surfou com o espírito da época e ocupou com maestria um espaço no qual os filmes da Disney já haviam reinado, tornando-se o mais bem-sucedido dos cineastas estadunidenses. Além do mais, diretores de sua geração, como Scorsese, Coppola, Bogdanovich, De Palma e Cimino, entre outros, continuaram fazendo cinema para um público mais adulto.

Ailton Monteiro

0 comentário em “Sci Files: Os 40 Anos de E.T. – O EXTRATERRESTRE

Comente o conteúdo da postagem

Este site utiliza o Akismet para reduzir spam. Saiba como seus dados em comentários são processados.